metaboliza o medicamento no fígado. O metabolismo do medicamento (também chamado de biotransformação) pode fazer com que o medicamento fique inativo e, portanto, inútil para o corpo ou, em alguns casos, libere um metabólito ativo que produz um efeito terapêutico. Os rins excretam quase todos os medicamentos e seus metabólitos. A excreção do medicamento pode começar quase simultaneamente à administração; assim, uma pequena quantidade do medicamento nunca é utilizada. Clearance é um termo usado com frequência para descrever a taxa de excreção do medicamento. O objetivo da administração da medicação é dar uma quantia de um medicamento que será absorvida pelos tecidos pretendidos em quantidade suficiente para que se obtenha o efeito desejado antes que tudo possa ser metabolizado e excretado. O tempo e a eficiência com os quais um medicamento passa por esses processos pode variar muito de pessoa para pessoa (variabilidade interpaciente) e até mesmo de dose para dose no mesmo paciente (variabilidade intrapaciente). A farmacocinética pode ser examinada determinando-se a meia- vida do medicamento e a área sob a curva de concentração (frequentemente abreviada como área sob a curva ). A faixa de variação terapêutica é a faixa da concentração sérica do medicamento que é capaz de alcançar o efeito desejado sem a ocorrência de toxicidades limitadoras de dose. As faixas de variação terapêuticas oscilam entre medicamentos. Para medicamentos com uma ampla faixa de variação terapêutica, a dosagem necessária para que se obtenha a eficácia em um grande percentual de pacientes é muito inferior à dosagem que se espera que produza efeitos adversos em um grande percentual de pacientes. Isso significa que é possível dar a todos os pacientes uma dosagem de um remédio que seja alta o bastante para alcançar seus efeitos terapêuticos sem fazer com que muitos pacientes corram risco de efeitos colaterais. Penicilina e ibuprofeno são exemplos de medicações que têm uma ampla faixa de variação terapêutica. Terapias anticâncer, por outro lado, são exemplos de medicações que têm uma faixa de variação terapêutica muito estreita. Para esses medicamentos, a dosagem necessária para se obter a eficácia anticâncer não é muito inferior à dosagem que pode resultar em toxicidades ou efeitos adversos que representem ameaça à vida. Devido à grande variabilidade interpaciente na quantidade de medicamento no sangue e à variabilidade na resposta do tumor, é difícil determinar uma dose média segura que seja eficaz em um alto percentual de pacientes sem causar um alto percentual de efeitos colaterais. Da mesma maneira, idade, gênero, peso, função dos órgãos (incluindo recuperação de ciclos ou terapias anteriores), situação nutricional, exposição a outras substâncias químicas carcinogênicas e a presença de medicamentos concomitantes podem afetar a absorção, o metabolismo e a excreção de um medicamento. Pode ser necessário ajustar as doses de medicação também de acordo com esses fatores. A dosagem precisa do medicamento em terapias anticâncer em crianças pode ser um desafio. A maioria das medicações é feita para adultos, e a dosagem pediátrica costuma ser um uso não padronizado dessas medicações para adultos (Ivanovska, Rademaker, van Dijk e Mantel-Teeuwisse, 2014). Embora os processos fisiológicos responsáveis pela farmacocinética em crianças sejam diferentes dos de adultos ( Tabela 2.8 ), eles também podem ser diferentes de criança para criança dependendo da idade, com crianças abaixo de um ano de idade sendo as mais afetadas. As diferenças fisiológicas mais relevantes em termos de farmacocinética entre as faixas etárias de crianças incluem percentuais de gordura corporal, volume
sanguíneo, água intracelular e extracelular, fluxo sanguíneo, produção de hormônios e enzimas e desenvolvimento renal e hepático (Adamson et al., 2016; Crom, 1994; Kearns et al., 2003). Além disso, embora medicações orais sejam normalmente consideradas ideais, o pH gástrico, o desenvolvimento gástrico e a motilidade, a capacidade de engolir comprimidos e a de tolerar sabores desagradáveis também variam entre crianças de diferentes idades (Ivanovska et al., 2014). Consequentemente, a variabilidade farmacocinética observada em crianças é muito maior do que a vista em adultos. Já se mostrou que diversos agentes antineoplásicos são afetados por diferenças relacionadas à idade, incluindo alterações no volume de distribuição e alterações no clearance hepático (doxorrubicina, ciclofosfamida) e renal (bleomicina, metotrexato). Essas diferenças relacionadas à idade podem alterar a exposição sistêmica à quimioterapia, bem como a eficácia e o perfil de toxicidade para doses padrão de medicamentos antineoplásicos. FARMACOGENÉTICA Farmacogenética é o estudo de como a composição genética de uma pessoa afeta a resposta dela à terapia com o medicamento. De forma semelhante àquela como a genética influencia a cor dos olhos e do cabelo, os genes podem determinar outros aspectos de cada indivíduo, indo até o nível das enzimas produzidas no fígado. Em geral, medicações interagem com proteínas e enzimas, e todas as proteínas e enzimas são codificadas por genes. A ordem das bases proteicas (adenina [A], citosina [C], guanina [G] e timina [T]) no ácido desoxirribonucleico (DNA) determina a composição genética de uma pessoa. O Projeto Genoma Humano mostrou que 1 em cada 300–1.000 bases pode variar de um indivíduo para o outro. Se essas proteínas e enzimas variantes estão envolvidas na absorção, metabolismo ou responsividade do corpo ou das células tumorais a medicações, variações genéticas (também chamadas de polimorfismos) podem ser parte do motivo pelo qual os indivíduos são diferentes uns dos outros na reação a um remédio. Como essas enzimas determinam a velocidade com que um medicamento é removido do corpo, variações no gene responsável por codificar uma enzima específica podem resultar em grandes diferenças na maneira como as pessoas reagem aos medicamentos. Assim, a quantidade de medicamento necessária para que alcance uma faixa de variação terapêutica depende de fatores genéticos, além de peso ou área de superfície corporal. Diferenças individuais na reação a medicações são frequentemente causadas por variantes de sequência em genes que codificam enzimas metabolizadoras de medicamento, transportadores de medicamento ou alvos de medicamento. A Tabela 2.9 lista alguns dos genes identificados e as medicações que se sabe que eles afetam. Para entender os efeitos dos genes sobre medicações, dois exemplos úteis são a tiopurina metiltransferase (TPMT) e o citocromo P450 2D6 (CYP2D6). A enzima TPMT é codificada pelo gene TPMT e está envolvida na metabolização de tiopurinas, como o produto ativo da mercaptopurina, para torná-las inativas. Em um pequeno grupo de pessoas, variações nos alelos do gene TPMT podem resultar em uma deficiência herdada da enzima TPMT. Se suas doses de mercaptopurina não forem reduzidas em uma adaptação a essa deficiência, elas sofrerão toxicidades devidas ao excesso de medicamento biodisponível em seu sistema. A redução adequada de sua dose não reduzirá sua chance de controle da doença, pois a quantidade de medicamento biodisponível estará dentro da faixa de variação terapêutica.
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Capítulo 2. Visão Geral do Câncer
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